Sonhei, um dia desses, com um parente que nem conheci. Ele faleceu muito antes de eu nascer, mas as imagens pareciam muito claras. Era como se eu tivesse convivido, na mesma época, nos seus oito anos de vida.
Então, liguei pra minha mãe para saber mais informações sobre sua morte. Mamãe era irmã dele. Me contou que Gustavo falecera de insuficiência respiratória. “Ele possuía um buraco no coração. Ao invés de duas, eram três válvulas que bombeavam o sangue para o coração, isso fazia misturar o sangue venoso com o arterial”, contou. Fiquei em estado de choque. Escrevi:
Ele tinha um coração puro
E debilitado de paixões.
Continuei perguntando mais. Ela ficou curiosa por meu interesse tanto tempo depois. Expliquei o meu sonho a ela. Chorou. Disse que pode ser alguma coisa de outras vidas, afinal a única imagem que tinha dele era uma foto 3×4 preto-e-branca-amarelada quase se desfazendo. Escrevi:
Morreu dormindo
num sono leve e passageiro.
Tudo que sofreu na vida
a morte lhe poupou.
Noites de insônia
Aniversários que não comemorou
Livros que não leu
Amigos que não fez
Mas foi muito amado.
Pela mãe que lhe concebeu
Especial e Diferente
e o pai que lhe deu o braço.
no futebol que não jogou
e no destino que já estava traçado.
Não sou a primeira. O meu padrinho, outro irmão dele, teve uma sequência de sonhos quando descobriu que sua esposa estava grávida. Sonhou, inclusive, que Gustavo saía da barriga dela. Quando descobriu que era menina, ficou mais tranquilo. Se chamaria Lívia. Os sonhos cessaram, mas Lívia nasceu com pequenas deficiências físicas e o meu tio nunca deixou de pensar que tinha um pouquinho de Gustavo nela.
Ele tinha uma doença chamada Síndrome de Down.
Foto ilustrativa de Fernanda Falcão